É típico de quem
sou: num dia desisto da ideia grotesca de um dia ser escritora e no outro eu me
arrisco à escrita. É uma briga interna. Nesse instante, exato e fixo, pareço
ter desaprendido de escrever as palavras que querem sair de mim, porém, exatamente
por mim, eu estou tentando... Escondida, aqui no meu cantinho, na casa que vivi
a maior parte da minha vida, pus-me a escrever um milhão de palavras para aliviar
meus medos e confiar que o futuro será melhor. Assim, bem simples. Uma vez, num
instante exato e fixo no passado, eu disse que morria de medo de perder
novamente as coisas bonitas que eu tinha na vida. E agora, com tudo voltando à
tona, imaginei mil acontecimentos terríveis, mal súbitos, mortes irreparáveis,
sangue saindo pelas vias aéreas das pessoas doentes e qualquer terror insano
que eu não posso falar para ninguém, pois ninguém entenderia. A não ser o Luis.
O Luis me entenderia. Mas há ainda muitos medos. Tenho tantos. Mas o que é a
vida, senão esses acontecimentos bruscos que trazem terror? Num dia está tudo
bem, há felicidade e esperança, e no outro, “puf”, as coisas se estragam. Ao
passo que, num dia estamos muito tristes e acontece algo feliz... mas me parece
que não há acontecimentos felizes o bastante para mudarem a tristeza. É preciso
tempo, recuperação e gasto de energia para atravessar a tristeza. A gente só se
recupera dos acontecimentos ruins, nunca dos felizes. Aí, em um dia, não tão de
repente assim, as coisas estão bem mais uma vez. Mas hoje? Bem, estamos todos atravessando. O tempo. Buscando recuperação. E gastando energia. E é
por isso que pus-me a escrever, porque sinto-me aprisionada em tantos pensamentos
que outrora, acredito, não terão mais efeito sobre o meu ser. Isso nunca me
havia feito tanto sentido como faz agora, pois não é de hoje que eu imagino tantas
coisas terríveis e as supero gradualmente, como um machucado sarando. Necessito
apenas que o tempo passe. Todos necessitam. A vida é uma travessia e eu, agora,
só espero ter palavras suficientes para atravessá-la.